Massacre na Nigéria: saiba mais sobre o Boko Haram
- 15 janeiro 2015
O grupo militante islâmico Boko Haram - acusado de realizar um massacre na Nigéria na semana passada - luta para derrubar o governo e criar um Estado islâmico.
Além de ataques a cidades do país, ele também realiza sequestros e assassinatos, desde sua fundação no norte nigeriano, em 2002.
Seus integrantes seguem a seguinte frase do Corão, o livro sagrado dos mulçumanos: "Qualquer um que não é governado pelo que Deus revelou está entre os transgressores".
O Boko Haram prega uma versão do Islã que proíbe que os muçulmanos tomem parte em qualquer atividade política ou social relacionada com a sociedade ocidental.
Isso inclui votar em eleições, vestir camisas e calças ou receber uma educação secular.
O nome oficial do grupo é Jama'atu Ahlis Sunna Lidda'awati wal-Jihad, que em árabe significa "Pessoas comprometidas com a propagação dos ensinamentos do Profeta e da Jihad".
Mas os moradores de Maiduguri, cidade no nordeste do país onde o grupo tinha sua sede, o apelidaram de Boko Haram. Em tradução livre da língua local, hausa, o apelido significa "a educação ocidental é proibida".
Resistência
Desde que o califado de Sokoto - que governou uma região que hoje é espalhada pelo norte da Nigéria, o Níger e o sul de Camarões - caiu sob o controle britânico, em 1903, alguns muçulmanos da região apresentam resistência à educação ocidental.
Eles se recusam a enviar os seus filhos para "escolas ocidentais" administradas pelo governo, um problema agravado pela elite dominante local, que não vê a educação como uma prioridade.
Neste contexto, o carismático clérigo muçulmano Mohammed Yusuf criou o Boko Haram, em Maiduguri. Ele montou um complexo religioso, que incluiu uma mesquita e uma escola islâmica.
Muitas famílias muçulmanas pobres de toda a Nigéria, bem como de países vizinhos, matricularam seus filhos na escola.
Mas o Boko Haram não está interessado apenas em educação.
Seu objetivo político é criar um Estado islâmico, e a escola tornou-se um campo de recrutamento para jihadistas.
Audacioso
Em 2009, o Boko Haram realizou uma onda de ataques a delegacias e outros prédios do governo em Maiduguri.
Isso levou a tiroteios nas ruas da cidade - centenas de simpatizantes do grupo foram mortos e milhares de moradores fugiram da região.
As forças de segurança da Nigéria tomaram a sede do grupo, capturaram vários de seus combatentes e mataram Yusuf.
Seu corpo foi exibido pela televisão estatal, e as forças de segurança declararam que o Boko Haram havia sido extinto.
Mas seus combatentes se reagruparam sob um novo líder, Abubakar Shekau, e intensificaram sua insurgência.
Em 2010, os Estados Unidos o designaram o grupo como organização terrorista, em meio a temores de que ele tinha estabelecido ligações com outros grupos militantes extremistas, como a Al-Qaeda.
Estado de emergência
O Boko Haram ficou conhecido, inicialmente, pelo uso de homens armados em motocicletas que matavam policiais, políticos e qualquer um que o criticasse, incluindo clérigos de outras tradições muçulmanas e pregadores cristãos.
O grupo também tem promovido ataques mais audaciosos no norte e no centro da Nigéria, como o bombardeio de igrejas, ônibus, bares, quartéis militares e até mesmo sedes policiais e da ONU na capital, Abuja.
Em meio à crescente preocupação com a escalada da violência, o presidente Goodluck Jonathan declarou estado de emergência, em maio de 2013, nos três Estados do norte onde Boko Haram é mais forte - Borno, Yobe e Adamawa.
Jonathan prometeu colocar em prática "medidas extraordinárias" contra os insurgentes para "reestabelecer a normalidade" na região.
O envio de tropas levou muitos dos militantes a deixarem Maiduguri, sua principal base urbana, em direção à floresta Sambisa, ao longo da fronteira com Camarões.
A partir de lá, os combatentes do grupo lançaram ataques em massa contra aldeias, realizando saques, matando e queimando propriedades, no que parecia ser um alerta para que a população rural não colaborasse com as forças de segurança - como os moradores de Maiduguri tinham feito.
A declaração de estado de emergência não surtiu o efeito desejado, no entanto.
No ano que precedeu esta declaração, houve 741 mortes de civis nos três Estados onde o Boko Haram mais atua, segundo dados coletados pela Universidade de Sussex, do Reino Unido.
No ano seguinte, este número mais do que triplicou, para 2.265.
Sequestro e massacre
O Boko Haram também intensificou sua campanha contra a educação ocidental, que, segundo ele, corrompe os valores morais dos muçulmanos, especialmente das meninas.
O grupo já havia atacado um internato em Yobe em março de 2014. Em abril do mesmo ano, sequestrou 276 estudantes em Chibok, dizendo que iria tratá-las como escravas e casá-las, numa referência a uma antiga crença islâmica de que as mulheres capturadas em conflito fazem parte do "espólio de guerra".
Ele fez uma ameaça similar em maio de 2013, quando divulgou um vídeo dizendo que tinha feito reféns mulheres e crianças em resposta à prisão de mulheres e filhos dos seus membros. Houve depois uma troca de prisioneiros, em que ambos os lados liberaram seus reféns.
Entre as reféns do sequestro em abril passado, mais de 50 conseguiram escapar.
As outras continuam desaparecidas, apesar das promessas do governo nigeriano de encontrá-las, dos drones americanos que foram espalhados para buscá-las pelo bosque de Sambisa e da megacampanha do Twitter, #BringBackOurGirls (na tradução, "tragam de volta nossas meninas"), que sensibilizou milhares de pessoas no mundo inteiro.
No último fim de semana, 23 pessoas foram mortas por três mulheres-bomba, uma das quais tinha apenas 10 anos de idade.
O primeiro ataque suicida ocorreu no sábado, em Maiduguri, quando uma menina-bomba matou ao menos 19 pessoas.
No domingo, duas mulheres-bomba mataram quatro pessoas e deixaram mais de 40 feridas na cidade de Potiskum.
No último mês, mais de 30 pessoas foram mortas em ataques suicidas simultâneos na cidade de Jos, que tem cristãos e islâmicos em sua população.
Outras centenas de mortes foram registradas na semana passada, segundo relatos, durante a captura pelo Boko Haram da cidade de Baga, no Estado de Borno, no nordeste do país.
Pobreza crônica
Analistas dizem que o norte da Nigéria tem um histórico de grupos militantes islâmicos, mas que o Boko Haram provou ser muito mais letal, com uma agenda jihadista global.
Para especialistas, a ameaça desapareceria se o governo da Nigéria conseguisse reduzir a pobreza crônica da região e implantar um sistema de ensino que ganhasse o apoio dos muçulmanos locais.
Will Ross, correspondente da BBC News em Lagos, a principal cidade da Nigéria, diz que a violência no país não tem fim e é cada vez mais chocante, citando o uso de uma criança em um dos ataques suicidas do último fim de semana.
"As Forças Armadas nigerianas tiveram algumas vitórias, mas têm uma tarefa muito difícil, de proteger civis de homens-bomba e atiradores que estão espalhados por uma grande área no nordeste do país. Por isso, com frequência, são dominadas pelos militantes e falham em sua missão. As autoridades do país não gostam de ouvir isso, mas é verdade", afirma Ross.
"O mundo está lentamente começando a manifestar indignação com a recente violência, mas, além disso, e de uma ajuda limitada, não parece haver vontade de se envolver mais profundamente no conflito."
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