Este blog tem por objetivo auxiliar a compreensão do mundo atual através de material coletado e comentados dos principais jornais e revistas, bem como artigos sobre questões de geografia e atualidades, e também mostrar um pouco da minha vida. Um abraço a todos.
Casal de namorados

adoro pintar telas
domingo, 4 de outubro de 2015
DESIGUALDADES E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL
Desigualdade&e&indicadores&sociais&no&Brasil
Francisco!Vidal!Luna!e!Herbert!S.!Klein
O! Sociólogo! e! as! Políticas! públicas:! Ensaios! em! Homenagem! a! Simon!
Schwartzman! /! Luisa! Farah! Schwartzman,! Isabel! Farah! Schwartzman,!
Felipe! Farah!Schwartzman,!Michel! Lent!Schwartzman,! organizadores.!—
Rio! de! Janeiro:! Editora! FGV,! 2009.! Pp! 97O116.
ISBN!978O85O225O0736O8
5
Desigualdade e indicadores sociais no Brasil*
FRANCISCO VIDAL LUNA E HERBERT S. KLEIN
A maioria dos indicadores sociais no Brasil mostram uma expressiva melhoria
nos últimos anos, mas persistem níveis de desigualdade incompatíveis
com a renda e a posição do país no cenário internacional. Em 2005,
os 10% mais ricos da população respondiam por 45% da renda, enquanto
aos 50% mais pobres cabiam apenas 14%. O resultado é ainda mais dramático
quando vemos que os 50% mais pobres se apropriavam de percentual
similar ao controlado por um segmento que representava apenas 1%
da população.1 Apesar da melhoria dos últimos anos, o índice de Gini
mostrava ainda elevado padrão de concentração, com 0,559 em 2006.2 A
maioria dos países latino-americanos situava-se na faixa média ou superior
aos 50, enquanto os países mais industrializados se encontravam no
patamar dos 30 ou no início dos 40.3 O próprio Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), ao analisar a Pnad de 2006, que mostrava
uma tendência positiva em vários indicadores distributivos, fazia uma
comparação entre o Brasil e o Canadá, país grande como o Brasil, federativo
e com grande diversidade social. Como a desigualdade na distribui-
1 Segundo o Ipeadata (renda domiciliar), enquanto os 50% mais pobres se apropriam
de 14,06% da renda, o grupo que compõe o 1% mais rico responde por 12,97%.
2 De acordo com as primeiras análises da Pnad 2006 (Ipea, set. 2007).
3 Ferranti et al., 2004, fi gs. 2 e 3, p. 2-10, fornecem os mais recentes índices de Gini
latino-americanos.
* Tradução de Mariana Timponi Rodrigues.
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ção da renda no Canadá, medida pelo índice de Gini, estava quase 17
pontos abaixo da brasileira, mantida a atual tendência de melhoria nos
indicadores de desigualdade, seriam necessários 25 anos para que o Brasil
se equiparasse ao valor atual do índice de Gini do Canadá.4 Estima-se
que, pelos padrões mundiais e pela renda per capita brasileira, deveria resultar
em uma proporção de 10% de pobres em relação à população total
do país. Contudo, 30% da população brasileira foram considerados pobres
em 2005, o que representa 55 milhões de pessoas, das quais 21 milhões
de indigentes, apesar da relativa melhoria ocorrida nos últimos cinco
anos. Isso mostra que o Brasil exibe índices de desigualdade e pobreza
muito elevados, mesmo em relação a padrões latino-americanos, a região
com o maior grau de desigualdade no mundo.5
Desigualdade na educação
Não é fácil entender a causa dessa extraordinária disparidade entre o
Brasil e outros países de tamanho, tipo de organização e até mesmo história
semelhantes. Desde a década de 1970, a causa dessa concentração
de riqueza tem sido intensamente debatida, e muitos se utilizam de modelos
internacionais para estudar essa questão. Contudo, tais instrumentos
de análise nos permitem apenas entender a atual distribuição de renda,
sobretudo de salários. Nessa área, é claro, a educação é uma variável
fundamental.
4 Primeiras análises da Pnad 2006 (Ipea, set. 2007). É importante enfatizar que os
dados atuais da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) têm abrangência
nacional e incorporam também as áreas rurais.
5 Como concluiu um estudo recente do Banco Mundial: “De acordo com pesquisas de
domicílio, os 10% mais ricos recebem entre 40% e 47% da renda total na maioria das
sociedades latino-americanas, enquanto os 20% mais pobres recebem apenas 2%-4%.
Tais diferenças são substancialmemte maiores do que as verifi cadas nos países da
OCDE, no Leste europeu e na maioria da Ásia. Além disso, a característica mais distintiva
da desigualdade de renda latino-americana é a concentração de renda incomumente
elevada no topo da distribuição. Até os países latino-americanos mais equitativos
— Costa Rica e Uruguai — apresentam níveis bastante elevados de desigualdade de
renda” (Ferranti et al., 2004:3).
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 99
Foi somente na metade do século XX que o governo brasileiro fi nalmente
se comprometeu com a educação pública para todos os cidadãos,
muito depois de isso já ter se tornado norma na maioria dos países da
América Latina. Essa política explica em grande parte os índices de analfabetismo
extraordinariamente altos no país ainda hoje. A restrita educa-
ção pública existente era, porém, de qualidade razoável, e tanto os pobres
quanto a classe média que tinham acesso à educação pública se benefi ciavam
de um ensino de alta qualidade, especialmente nas então escolas
públicas secundárias de elite. Os alunos tinham boas chances de ingressar
em universidades públicas e gratuitas e de competir por empregos
com os estudantes ricos vindos de escolas particulares.
Paradoxalmente, a abertura do sistema público de educação para toda
a população causou, com o passar do tempo, uma desigualdade ainda
maior. A partir da década de 1970, uma política de universalização da
educação básica foi posta em prática, cuja meta de completa cobertura
foi fi nalmente atingida na última década do século XX. Porém, a universalização
não signifi cou igualdade de oportunidades, uma vez que a
massifi cação do ensino primário e secundário se deu em detrimento da
qualidade. Isso criou um sistema dual no qual os pobres vão para escolas
primárias e secundárias públicas e os ricos mandam seus fi lhos para escolas
primárias e secundárias particulares de boa qualidade. Os alunos
provenientes das melhores escolas particulares, por sua vez, conseguem,
via vestibulares concorridos, uma parcela desproporcional das vagas disponíveis
nas universidades públicas — as melhores do país. Já a maioria
dos alunos provenientes das escolas públicas não obtém uma educação
de qualidade sufi ciente para ingressar nas universidades públicas via vestibular
e se veem obrigados a pagar por uma educação universitária de
qualidade inferior nas precariamente organizadas faculdades particulares.
Apesar de existirem algumas instituições e faculdades privadas de
qualidade, estas só aceitam os alunos que conseguiriam passar nos vestibulares
das universidades públicas. Os alunos provenientes das escolas
públicas também se encontram despreparados para o mercado de trabalho,
em contraste com os que frequentam as universidades públicas e
institutos especiais.
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Em resumo, o sistema educacional brasileiro tal como constituído hoje
reforça o processo de concentração de renda e aumenta a desigualdade,
em vez de diminuí-la. Existem agora trajetórias bem distintas para ricos
e pobres: os primeiros recebem uma educação de padrão comparável ao
do Primeiro Mundo, e os últimos, apesar do acesso universal à educação
primária, são marginalizados pela qualidade do ensino que recebem. A
qualidade da educação pública primária é tão baixa que muitos dos alunos
que frequentam as séries primárias ainda são defi nidos como analfabetos
funcionais. Estudos sobre a distribuição de renda mostram a educação
como fator fundamental para explicar diferenças nos salários. É
inegável que há, em geral, uma forte correlação entre o número de anos
de estudo e o salário percebido, mas talvez isso seja uma leitura incompleta
da natureza da estrutura distributiva. Se a educação fosse o único fator
importante para explicar a desigualdade, então bastaria universalizar
a educação e aumentar o número médio de anos de estudo para reduzir
os níveis de desigualdade. Seria isso verdade?
Nos últimos 25 anos, o número de crianças na escola atingiu níveis
bastante elevados e a média de anos de estudo tem constantemente aumentado,
mas não houve qualquer mudança em termos de desigualdade
no Brasil. Para uma pequena quantidade de empregos que demandam
alta qualifi cação, há uma oferta limitada de bons profi ssionais, geralmente
educados em boas escolas primárias e secundárias particulares e
formados por boas universidades públicas e particulares. Esses alunos
mais ricos têm acesso privilegiado à informação e à educação complementar
em áreas fundamentais, como línguas estrangeiras. O maior nível
econômico e social de seu país também facilita o acesso ao mercado de
trabalho. A baixa qualidade da educação oferecida aos mais pobres os
coloca em desvantagem no mercado de trabalho. A educação que recebem
não os prepara para as ocupações no mercado de trabalho formal que
demandam maior qualifi cação. Dessa maneira, o atual sistema educacional
no Brasil reforça a estrutura social existente. Apesar de a educação ser
normalmente um fator fundamental na mobilidade social, o atual sistema
educacional brasileiro é incapaz de promover mudanças na rígida estrutura
de distribuição de renda.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 101
Recentemente, alguns estudos têm demonstrado que o grande esforço
educacional realizado nos últimos 10 anos passou a produzir resultados
no mercado de trabalho, reduzindo a desigualdade salarial explicada pelas
diferenças educacionais. O processo ocorreu tanto pela diminuição
das disparidades de anos de estudo da população, quanto por mudanças
no mercado de trabalho, que diferencia menos por nível educacional. Os
dois efeitos em conjunto explicariam 37% da queda na desigualdade nos
rendimentos do trabalho.6
Política econômica e desigualdade
O processo de industrialização induzida, que se iniciou na década de
1930, alterou profundamente a estrutura produtiva do país, modernizando
a economia e provocando uma migração dramática da população
para os centros urbanos. Hoje, todas as regiões do país estão integradas à
economia de mercado, integração que foi ajudada pela industrialização e
pela expansão do mercado de trabalho moderno. Para a população como
um todo houve um aumento sensível da renda, bem como de todos os
indicadores sociais. Contudo, apesar dessas mudanças, a estrutura de
concentração da riqueza que marca o país como um dos mais injustos do
mundo não se alterou. Mesmo comparado a outros países da América
Latina, o Brasil se destaca, apesar de esses países terem processos de colonização,
urbanização e industrialização semelhantes.
É claro que as reformas feitas pelo governo Kubitschek na metade da
década de 1950 nas políticas federais de industrialização foram fundamentais
para a criação do moderno mercado nacional. Em apenas alguns
anos, foram estabelecidas as indústrias automotiva e de bens duráveis, o
que rapidamente supriu as necessidades básicas do mercado interno e
propiciou a criação de um mercado de consumo moderno. Esse mercado
precisava que uma parcela grande da população tivesse renda alta, o que
por sua vez se tornou possível graças ao surgimento de uma classe operá-
ria com salários mais altos, pagos por essas indústrias. A política nacio-
6 Barros, Franco e Mendonça, 2007.
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nal apoiava tanto os trabalhadores quanto os industriais na criação desse
moderno mercado, mas tendia a reforçar o processo de concentração
de renda. Por isso, esses benefícios não atingiram a maior parte da população.
Não há dúvida de que todos se benefi ciaram desses anos de crescimento,
mas foi nesse período também que teve início o debate nacional
sobre a distribuição da riqueza no país. Esse debate questionava o modelo
brasileiro como um todo, que se baseava no controle dos salários para
subsidiar a expansão.
Os defensores da política nacional argumentavam que ela havia promovido
a inclusão de novos trabalhadores na economia de mercado e que as
distorções na distribuição da renda eram apenas transitórias.7 Dizia-se que
o desequilíbrio entre a crescente demanda por profi ssionais altamente
qualifi cados e a pequena quantidade desses profi ssionais no mercado era a
causa das grandes distorções na estrutura salarial. Argumentava-se que
isso era apenas um problema passageiro, que seria resolvido com o aumento
do número de profi ssionais qualifi cados no mercado. Os críticos desse
pensamento diziam que não se tratava de uma concentração de renda transitória,
causada por distorções no mercado de trabalho e, sim, uma consequência
da política econômica implantada pelo governo, especialmente no
que dizia respeito ao controle artifi cial dos salários imposto pelos militares,
mesmo durante os anos de crescimento econômico extraordinário.8
A crise da década de 1980, marcada por baixo crescimento e infl ação
alta, não reduziu as distorções na renda. A renda per capita absoluta cresceu
pouco nesse período, e não houve um processo redistributivo. A infl a-
ção causava a deterioração de todos os salários, mas era mais perversa com
os trabalhadores que não possuíam mecanismos efetivos para proteção. A
renda não proveniente de salário, especialmente a que estava ligada ao
mercado fi nanceiro, usava a indexação para proteger seus ganhos. Até
aqueles que recebiam altos salários podiam proteger sua poupança dessa
maneira. Por esse motivo a recessão e a infl ação alta foram profundamente
negativas na evolução do nível absoluto de renda e de sua distribuição.
7 Langoni, 1973.
8 Fishlow, 1973.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 103
Em 1986 ocorreu o primeiro plano de estabilização, que conseguiu temporariamente
controlar a infl ação e promover forte crescimento. Como
esse programa durou apenas um ano, não foi capaz de reverter de forma
permanente nenhum indicador de distribuição de renda, apesar de ter
temporariamente reduzido as desigualdades salariais.
A estabilidade criada pelo Plano Real em 1994 trouxe alívio para o segmento
mais pobre da população. O fi m da infl ação representou também
o fi m do imposto infl acionário que corroía a renda dos mais pobres. A
estabilidade criou um grande aumento na demanda, principalmente dos
segmentos mais pobres, por bens e alimentos. Porém, dois fatores reverteram
esse processo. O primeiro foi a instabilidade da economia internacional,
que tornou o país mais vulnerável às crises externas, e a adoção de
medidas recessivas para promover o ajuste do balanço de pagamentos. O
segundo foi a adoção de reformas liberais de privatização e a abertura da
economia, que provocaram grandes transformações nas indústrias e nos
empregos. A maioria das empresas se modernizou e reduziu seu quadro
de funcionários. Os empregos que restaram exigiam alta qualifi cação e
muitos dos novos empregos foram criados na parte inferior do mercado
de trabalho. Tudo isso contribuiu para uma grande expansão da economia
informal e o crescimento do desemprego, o que apenas reforçou o
sistema injusto de distribuição de renda. O baixo crescimento ocorrido
durante o governo Fernando Henrique Cardoso e nos primeiros anos do
mandato do presidente Lula não favoreceu a ampliação do nível de emprego,
particularmente do emprego formal. Nos quatro últimos anos,
embora sem aproveitar adequadamente o potencial gerado pelo desempenho
excepcional da economia mundial, houve um aumento nas taxas
médias de crescimento da economia, com recuperação do emprego formal
e informal. Desde 2005 ocorre também uma queda sistemática nas
taxas de desemprego das regiões metropolitanas,9 mas o rendimento real
das pessoas empregadas, em dezembro de 2007, era inferior ao valor obti-
9 IBGE, tabela 158 — pessoas com 10 anos ou mais de idade, desocupadas na semana
de referência, por regiões metropolitanas, segundo os meses de referência (mar. 2002-
dez. 2007).
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do no primeiro semestre de 2002.10 Por outro lado, continua o processo
de redução gradativa da desigualdade salarial, iniciada quando da implantação
do Plano Real.11
Em face do baixo crescimento da economia e do emprego, o governo
Fernando Henrique Cardoso criou algumas políticas compensatórias de
distribuição de renda, intensifi cadas no governo Lula. O Bolsa Família,
que consolidou e ampliou os programas existentes e que benefi ciava 11 milhões
de famílias em dezembro de 2007, talvez seja o mais importante.12
As desigualdades regionais
A questão da desigualdade também pode ser vista em termos de local de
residência e cor. Além da dicotomia urbano/rural encontrada na maioria
dos países em desenvolvimento, o Brasil também apresentava fortes disparidades
regionais, que, apesar de comuns nas sociedades industriais avançadas,
eram especialmente pronunciadas nesse país de proporções continentais.
Na década de 1970, as pessoas nascidas na região central do Nordeste,
a mais pobre do país, tinham uma expectativa de vida de surpreendentes
18,8 anos a menos do que as dos estados mais ricos do Sul — Paraná, Santa
Catarina e Rio Grande do Sul.13 Apesar de essas taxas terem melhorado em
todas as regiões, a diferença permaneceu a mesma entre as regiões mais e
menos desenvolvidas do país. Em 2004, a taxa de mortalidade infantil no
Nordeste ainda era o dobro daquela da Região Sudeste (ou 34 mortes por
mil nascimentos contra 15 mortes por mil nascimentos).14 Essa disparidade
também estava presente nas taxas de analfabetismo. Em 1999, na Região
Nordeste, surpreendentes 34% da população acima de 15 anos foram consi-
10 IBGE, tabela 134 — rendimento real do trabalho principal, habitualmente recebido
por mês, por pessoas de 10 anos ou mais de idade, ocupadas no trabalho principal.
Conjunto dos dados das regiões metropolitanas de Recife, Salvador, Belo Horizonte,
Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre.
11 Barros, Franco e Mendonça, 2007:33.
12 Dados disponíveis em: .
13 Wood e Carvalho, 1994:115, tab. 4.4; e IBGE, 2003, tab. População 1982aeb-049.1.
14 Datasus, indicadores de mortalidade, taxa de mortalidade infantil. Disponível em:
.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 105
derados analfabetos funcionais, contra apenas 22% nas regiões Sul e Sudeste.15
Apesar de essa diferença também ter diminuído nas últimas décadas,
ainda permanece bastante alta. Quando se considera a taxa normal de analfabetismo
das pessoas com 10 anos ou mais de idade, mostrada na última
Pnad, de 2006, a disparidade persiste: 18,9% no Nordeste contra 5,5% no
Sudeste. Nota-se uma menor disparidade quando se comparam os anos de
escolaridade dos maiores de 10 anos. Os dados de 2006 mostram um resultado
de 5,6 para o Nordeste e 7,5 para o Sudeste.16 Recentemente, a propor-
ção absoluta de matrículas de crianças em idade escolar é praticamente a
mesma entre essas regiões, o que sugere que essa diferença irá progressivamente
desaparecer nas próximas décadas.17 Ainda existem grandes problemas
com a proporção de alunos que concluem os estudos e com a diferença
da qualidade do ensino nessas regiões. Os estados do Sudeste gastam mais
com cada aluno do ensino fundamental do que os estados do Nordeste.
Com índices de pobreza mais elevados que o normal, a Região Nordeste
também possui moradias de pior qualidade. Isso é mostrado pelos dados
mais recentes sobre moradia da Pnad. Na pesquisa de 2006, por
exemplo, apenas 75% das residências no Nordeste tinham fornecimento
de água adequado, contra 92% dos estados do Sul. Quanto ao saneamento
básico, a situação era mais perversa: apenas 28% das residências no
Nordeste estavam ligadas à rede coletora de esgotos, contra 77% no Sudeste.
Apenas os índices de fornecimento de energia elétrica adequado
estavam próximos nas duas regiões: 94,7% no Nordeste e 99,6% no Sul.18
A pobreza e a inabilidade de alcançar índices de desenvolvimento semelhantes
aos das regiões mais ricas fi zeram do Nordeste um grande
exportador de mão de obra. Também não houve grandes mudanças nas
disparidades econômicas básicas, responsáveis por essas diferenças, principalmente
no Nordeste. Em 1985, o PIB da região correspondia apenas
a 35% do PIB da região mais rica do país, e essa diferença permanece
15 IBGE, 2003, tab. Educação 2000s2_aeb-82.
16 IBGE, Pnad, síntese dos resultados de 2006, p. 108-111.
17 Castro, 1999:11.
18 IBGE, Pnad, síntese dos resultados de 2006, p. 188-193.
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106 O SOCIÓLOGO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
elevada até nas mais recentes estimativas. Em 2004, a renda per capita nordestina
era ainda 39% da renda per capita do Sudeste.19 Apesar de abranger
29% da população em meados da década de 1990, o Nordeste respondia
por apenas 12% do PIB, enquanto sua participação industrial era de apenas
10% da produção, e até mesmo a produção agrícola respondia por apenas
17% da produção nacional.20 Enquanto isso, residiam no Nordeste 44% dos
pobres do país. A Região Sudeste continha aproximadamente 44% da população,
mas apenas um terço dela era considerado pobre.21 Durante o último
quarto de século, algumas das disparidades sociais e econômicas
foram consideravelmente reduzidas, as diferenças regionais também mudaram
e um padrão mais geral passou a infl uenciar a maioria das regiões
do país. Esse resultado pode ser visto, por exemplo, na expectativa de vida:
a diferença entre as regiões mais saudável e menos saudável (Sudeste e
Nordeste) caiu para apenas 4,5 anos de vida no nascimento.22 Mas ainda
existem variações supreendentes: as mulheres no Nordeste vivem em mé-
dia 5,4 anos a menos do que as do Sudeste.23 Além disso, a população rural,
embora represente uma parcela cada vez menor da população em todas
as regiões, não alcançou os mesmos padrões de desenvolvimento em todas
as regiões desde a década de 1970, e as disparidades regionais permanecem
grandes. Contudo, as diferenças na taxa de fertilidade, que eram bem grandes
entre cada região, têm progressivamente desaparecido. De modo geral,
a diferença na taxa total de fertilidade nos estados do Nordeste e do Sudeste,
no período 1980-2000, caiu de 2,6 para 0,6 fi lho por mulher.24
19 Datasus, indicadores socioeconômicos, PIB per capita. Disponível em: .
20 Silva e Medina, 1999:12-13, tabs. 3-5.
21 Rocha, 1998:20, tab. 1B.
22 Datasus, indicadores demográfi cos, esperança de vida ao nascer. Disponível em:
.
23 Consultar tab. 8: Esperança de vida ao nascer e aos 60 anos de idade, por sexo, regiões
do Brasil e unidades da Federação, 2000, do Anuário Estatístico de Saúde 2001, do Ministé-
rio da Saúde.
24 IBGE, Censo 2000, taxas de fecundidade total segundo as grandes regiões — 1940-
2000. Disponível em: .
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 107
Apesar de todas as regiões terem melhorado dramaticamente no último
quarto de século, o Norte e o Centro-Oeste, que eram as menos desenvolvidas,
alcançaram um nível de desenvolvimento social comparável às
regiões tradicionalmente mais desenvolvidas do Sul e do Centro-Sul. Isso
se deveu em grande parte ao surgimento de novas áreas de agricultura
comercial, o que trouxe grande riqueza a essas regiões até então isoladas
e marginalizadas. Não só foram criados seis novos estados em antigos
territórios federais, mas o padrão de vida dessas regiões tornou-se próximo
ao dos estados mais desenvolvidos do Sul e do Centro-Sul.
Em termos sociais e demográfi cos, a riqueza do Centro-Oeste, região
até então isolada, rapidamente atingiu ou superou as médias nacionais.
Em 2002, 90% da população do Centro-Oeste de 10 anos ou mais tinham
mais de um ano de escolaridade, número melhor que a média nacional.25
Em 1980, por exemplo, a mortalidade infantil já era bastante baixa e, em
2004, era menor (18,7 mortes por mil nascimentos) que a média nacional
e um pouco maior que a metade da taxa de mortalidade infantil do Nordeste.26
Em 2000, a taxa de fertilidade, que em 1940 era maior do que a
média nacional (6,4 fi lhos), também passou a ser menor do que a média
nacional (2,2 fi lhos).27 A região cresceu tão rapidamente na década de
1990 e nos primeiros anos do século XXI que superou as regiões Sul e
Sudeste como principal destino de migração dos trabalhadores pobres
do Nordeste e tornou-se também uma região atraente para os fazendeiros
do Sul e do Sudeste.
A desigualdade étnico-racial
Além das diferenças regionais no tocante à riqueza, o Brasil, como todas
as sociedades das Américas que foram escravocratas, também sofreu com
o preconceito e a discriminação racial. Apesar do infi ndável debate entre
os brasileiros sobre se a condição dos descendentes de escravos resultaria
25 IBGE, Pnad 2002, Centro-Oeste, tab. 2.3.
26 Em 2004, a taxa nordestina era de 33,94, contra 18,7 do Centro-Oeste. Ver Datasus,
indicadores de mortalidade, taxa de mortalidade infantil. Disponível em: , e IBGE, Censo Demográfi co 1970-2000.
27 IBGE, Censo Demográfi co 1940-2000.
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108 O SOCIÓLOGO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
ou não da classe social ou da discriminação racial, é fácil constatar que
os negros têm menor mobilidade social e acesso a recursos. É verdade que
a divisão de cor entre negros, pardos e brancos contribuiu para amenizar
o preconceito racial da população. Além disso, a existência de brancos
pobres signifi ca que a pobreza não é defi nida exclusivamente pela cor, e as
favelas no Brasil são centros multirraciais. Isto posto, não há dúvida de
que o preconceito racial existiu durante todo o período posterior à emancipação
dos ecravos e de que os negros em especial sofreram a discrimina-
ção de todos os membros da sociedade.
Os melhores dados sobre a condição racial no Brasil vêm da Pnad. Na
última pesquisa, de 2006, estimou-se que 50% da população eram brancos,
43% mulatos e 7% negros.28 A população não branca (pardos e negros)
era maioria nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Apesar de nem
todas essas regiões serem consideradas pobres pelos padrões brasileiros, a
população não branca ocupava as classes mais baixas, mesmo nas regiões
mais ricas, e era a maioria na região mais pobre de todas, o Nordeste.
Também constatou-se que, entre a população de cor, o número de
analfabetos é bem maior do que entre os brancos. Em todo o país, os
adultos negros e pardos têm duas vezes mais chances de ser analfabetos
funcionais do que os brancos (ou 32% contra 18% em 2002). Essa diferen-
ça foi encontrada tanto nas zonas mais ricas quanto nas mais pobres.
Sendo assim, os estados do Sul e do Sudeste, que dispõem dos melhores
indicadores de qualidade de vida e educação, apresentam uma diferença
ligeiramente menor entre brancos e não brancos (17% de analfabetos funcionais
brancos contra 27% pardos e 20% negros).29 Dadas essas diferen-
ças nas taxas de analfabetismo, não é de supreender que a mesma diferença
seja observada na escolaridade, com a população de cor vindo
muito atrás da população branca. Em 2003, os adultos negros ou pardos
tinham em média dois anos a menos de educação que os brancos — ou
cinco anos contra sete de escolaridade.30
28 IBGE, Pnad, síntese dos resultados de 2006, p. 89.
29 Pnad 2003, tab. 11.3.
30 Ibid., tab, 11.7.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 109
Como era de se esperar, considerando-se os resultados referentes à educação,
as diferenças raciais de renda também eram grandes. Os resultados
da Pnad foram consistentes em todas as regiões e ocupações no que
diz respeito a diferenças de renda entre brancos e não brancos. Em 2003,
por exemplo, a renda da população branca era o dobro daquela da população
negra e parda, e isso foi observado em todas as regiões, exceto na
Norte, onde a população negra e parda tinha renda equivalente a dois
terços da renda média da população branca. Não foram observadas grandes
diferenças entre os sexos: os homens não brancos tinham uma renda
um pouco maior que as mulheres não brancas.31 A população de cor brasileira
também apresentava maior probabilidade de se situar na metade
inferior dos decis de renda do que a população branca. Cerca de 51% dos
brancos encontravam-se no topo, entre os 30% dos maiores rendimentos,
enquanto apenas 27% dos negros e pardos recebiam salários nessa mesma
faixa. Essa grande desigualdade também estava presente na distribui-
ção de ocupações, na composição de domicílio e na educação.32 Em 2003,
aproximadamente 6% dos brancos trabalhavam em serviços domésticos,
contra 10% de negros e pardos — e nas áreas mais ricas do país — esse
contraste era ainda maior, sendo essa relação nos estados do Sul e do Sudeste
de 6% de brancos contra 12% de negros e pardos. Por sua vez, 6% dos
brancos eram empregadores, contra apenas 2,2% de negros e pardos.33
Mesmo quando a população negra e parda tinha a mesma ocupação,
seu salário médio era consistentemente menor do que o dos brancos.34
Entre os 10% mais pobres, 68% eram negros e pardos, e entre os 10% mais
ricos, apenas 13%. Em ambos os casos, a proporção é muito diferente da
percentagem total de negros e pardos na população em geral.35 Estima-se
que a proporção de negros e pardos situada abaixo da linha da pobreza
no Brasil seja de 50%, enquanto a de brancos não passe de 25%.36
31 Pnad 2003, tab. 11.11.
32 Pnad 2001, microdados (IBGE, 2002), tab. 9.16.
33 Pnad 2003, tab. 11.13.
34 Ibid., tab. 11.14.
35 Ibid., tabs. 11.16 e 11.17.
36 Pnud, Cedeplar, Atlas racial brasileiro de 2004.
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110 O SOCIÓLOGO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
É evidente, então, que mais de um século após a emancipação, a população
descendente de escravos no Brasil ainda é em sua maioria pobre,
fator que certamente está relacionado a uma longa e complexa história de
discriminação, que permaneceu até mesmo após a emancipação. Também
é de se esperar que essas diferenças sejam sentidas em taxas mais altas
de mortalidade e menor expectativa de vida, mas esse tipo de informa-
ção por cor ainda não existe no Brasil. Contudo, cabe ressaltar que nem
todos os índices são negativos. Por exemplo, a diferença na média de anos
de escolaridade tem diminuído lentamente. As matrículas escolares de
2003 mostravam uma diferença pequena entre brancos, negros e pardos
em quase todas as faixas etárias. Apenas nos grupos mais velhos a diferença
era signifi cativa, e mesmo assim não tão extrema.37 O mesmo pode
ser dito em relação à organização familiar. A Pnad de 2003 mostrou que
basicamente não há diferenças de cor em termos de estrutura familiar. O
número de pessoas que moram sozinhas e de famílias com crianças che-
fi adas por mulheres foi idêntico para brancas e para negras e pardas.38 Da
mesma maneira, o número de famílias chefi adas por homens era praticamente
o mesmo entre brancos, pardos e negros. Sendo assim, a pobreza e
a desintegração familiar não são coincidentes no contexto brasileiro.
Contudo, o impacto da pobreza diferencial ainda é sentido nas taxas
de mortalidade. O Pnud, das Nações Unidas, estimou que, em 2000, a
taxa de mortalidade infantil entre os fi lhos de mães negras foi dois terços
maior do que entre os fi lhos de mães brancas. Apesar de a diferença na
expectativa de vida entre brancos de ambos os sexos e negros e pardos
ainda ser de 5,3 anos, esse número caiu consideravelmente, pois, em 1950,
a diferença era de 7,5 anos. Há pouca diferença na taxa de fertilidade entre
brancos e negros, apesar disso, as negras tendiam a fazer menos cesá-
rias e a ter uma taxa de fertilidade um pouco maior do que as brancas —
contudo, esses números têm fl utuado consideravelmente e não revelam
uma tendência clara. Dado o fato de serem mais pobres, os negros e par-
37 As percentagens foram 86%-79% para o grupo dos 15 aos 17 anos e 30%-23% para o
grupo dos 20 aos 24 anos. Pnad 2003, tab. 11.4.
38 Pnad 2003, tabs. 5 11.15a-11.15d.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 111
dos tendem a usar mais os hospitais que os brancos, e as diferenças na
expectativa de vida, ainda que estejam diminuindo, podem sugerir que a
população negra e parda tende a ser menos saudável que a população
branca.39
As áreas rurais e urbanas
Como em quase todos os países em desenvolvimento, o Brasil também
apresenta grandes diferenças entre as populações urbana e rural. Mas
essa diferença está gradativamente desaparecendo. Até 1970, a população
rural preocupava-se basicamente com a subsistência e tinha o padrão de
vida mais baixo do país. Era também a população com as maiores taxas
de mortalidade e fertilidade e com os níveis mais baixos de educação. A
pobreza era endêmica na área rural, e o contraste entre a sociedade rural e
urbana não poderia ser maior. Mas a combinação de crescimento do setor
urbano moderno e de revolução agrícola reduziu o número de trabalhadores
rurais na sociedade em geral, inclusive em números absolutos, e
também contribuiu para diminuir a percentagem de indigentes e pobres
nas áreas rurais. Sendo assim, a população rural atingiu seu número má-
ximo em 1970, com 41 milhões de pessoas (que então representavam 44%
da população), e continuou caindo a cada década, chegando a apenas 32
milhões em 2000 (o que representa apenas 19% da população).40 Em 1996,
aproximadamente dois terços da população brasileira viviam em cidades
de 20 mil habitantes ou mais.41
Com o grande crescimento da agricultura comercial moderna e a lenta
penetração dos meios de comunicação modernos nas áreas rurais, as
marcadas e tradicionais diferenças entre a população urbana e a rural
têm desaparecido gradativamente. Deve-se adicionar a esses fatores econômicos
a decisão extraordinariamente tardia do governo de, no fi nal do
século XX, estender os benefícios da previdência social à até então negli-
39 Pnud, Cedeplar, Atlas racial brasileiro de 2004.
40 IBGE-Sidra, tab. 1.288 — População nos censos demográfi cos por situação do domicílio.
41 Beltrão, Oliveira e Pinheiro, 2000:2.
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112 O SOCIÓLOGO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
genciada área rural. Entre as muitas políticas postas em prática, a mais
revolucionária foi a decisão do governo, em 1991, de garantir uma aposentadoria
básica (de um salário mínimo) a todos os trabalhadores rurais
— um conceito revolucionário na América Latina em termos de segurança
social e que praticamente eliminou a pobreza absoluta na área
rural. Apesar de as pensões parciais e por acidentes de trabalho para trabalhadores
rurais terem sido criadas na década de 1950, foi apenas na
Constituição de 1988 que o direito à aposentadoria foi estendido a todos
os trabalhadores rurais que atingissem uma certa idade, e somente em
1991 a medida foi fi nalmente implementada. Essa aposentadoria foi concedida
a todos os trabalhadores rurais que completassem 65 anos (homens)
e 55 anos (mulheres) independentemente de terem contribuído ou
não para o fundo nacional de aposentadoria do Instituto Nacional de
Seguridade Social.42 A partir da segunda metade do século XX, a saúde e
a educação pública começaram a ser levadas a muitas das áreas rurais
que até então permaneciam isoladas. Todos esses fatores contribuíram
para a progressiva redução das diferenças entre as populações urbana e
rural. Mas, apesar da redução nas diferenças entre os indicadores sociais
das áreas rural e urbana, essas permaneceram signifi cativas. A renda mé-
dia de uma família da zona rural era apenas a metade daquela de uma
família residente nos centros urbanos. Apenas pouco menos da metade
das famílias dos centros urbanos ganhava menos de cinco salários mínimos,
enquanto três quartos das famílias da zona rural situavam-se nessa
faixa de renda.43 Também é importante dizer que, em todas as regiões do
país, a distribuição de renda era moderadamente menos concentrada na
zona rural do que nas áreas urbanas.44
42 Beltrão, Oliveira e Pinheiro, 2000. A Constituição de 1988 também garantiu uma
pensão correspondente a um salário mínimo aos defi cientes e idosos. Esses dois benefícios
fazem parte dos programas de prestação continuada.
43 IBGE, 2003, tab. população 2000aeb_s020.
44 Da ordem de um índice de Gini de 59 nas áreas urbanas e de 55 na zona rural. IBGESidra,
tab. 2.037 — Índice de Gini da distribuição do rendimento nominal mensal dos
domicílios particulares permanentes, com rendimento domiciliar, por situação do domicílio.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 113
Conclusão
Se as diferenças entre sexos, locais de residência e possivelmente até raça e
etnia têm lentamente diminuído, a desigualdade na distribuição de renda
por classe social permanece inalterada. Esse é o maior problema hoje no
Brasil. Apesar da massifi cação da educação fundamental e, em menor medida,
do ensino médio, além da criação de uma vasta rede de universidades
federais, estaduais e privadas e da grande queda no índice de analfabetismo,
a desigualdade no Brasil continua a mesma. Apesar de as distorções
salariais e as políticas negativas de controle salarial serem comumente
usadas como justifi cativa para a desigualdade, o fato é que, mesmo em
épocas de crescimento econômico, com mercado de trabalho livre e governo
democrático, as distorções de renda e classe pouco mudaram no Brasil.
Todos reconhecem que esse é um problema signifi cativo, mas poucos têm
sugestões sérias sobre como pôr fi m a essas distorções. A pobreza e o analfabetismo
têm diminuído graças a políticas sociais mais intensas, mas a
riqueza continua concentrada como sempre foi. Segundo as Nações Unidas,
houve um aumento na desigualdade de renda em dois de cada três
municípios na década de 1990. Além disso, em 22 dos 23 estados e unidades
territoriais do país, o índice de Gini foi pior em 2000 do que era em
1990, sendo melhor apenas no estado de Roraima, na Região Norte, e mesmo
assim apenas porque a renda média caiu.45
Embora o Brasil ainda apresente indicadores sociais e de desigualdade
inaceitáveis, há claramente uma tendência geral positiva em todos os indicadores,
particularmente naqueles relacionados com a educação e a saú-
de. Há também uma gradativa redução nas desigualdades entre regiões,
sexos, raças e na comparação urbano/rural. Os avanços são menos expressivos
quando analisamos a distribuição de renda, pois só recentemente a
distribuição medida pelo índice de Gini passou a mostrar sinais positivos,
sendo os efeitos ainda tímidos, se considerarmos o grau de desigualdade
existente no Brasil. Se a estabilidade obtida com o Plano Real e a recuperação
do emprego representam os aspectos mais consistentes, outros as-
45 Pnud, Fundação João Pinheiro, Atlas do desenvolvimento humano no Brasil de
2003.
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114 O SOCIÓLOGO E AS POLÍTICAS PÚBLICAS
pectos também contribuem para a redução da desigualdade, como, por
exemplo, a política de elevação real do salário mínimo, que benefi cia também
aposentadorias; os programas de benefícios continuados (idosos e
defi cientes); a aposentadoria rural e os programas de distribuição de renda,
como o Bolsa Família. Esses programas, além de seu efeito positivo no
processo de redução da desigualdade, têm impacto na diminuição do nú-
mero de pessoas que vivem abaixo do nível de pobreza e de indigência.
Um estudo atual mostra que 28% da queda do índice de Gini no período
1995-2004 seriam explicados pelos programas de benefícios continuados
e pelo Bolsa Família. As aposentadorias, contributivas ou não, que se benefi
ciam do aumento real do salário mínimo explicariam 32% da melhoria
no índice de Gini.46 Embora a retomada do crescimento e do emprego
sejam elementos essenciais para a melhoria dos indicadores sociais, é evidente
que a desigualdade só será reduzida através de políticas públicas
efetivas no que diz respeito a serviços sociais fundamentais, como educa-
ção e saúde, saneamento e habitação, e de políticas compensatórias que
distribuam renda, como as implantadas nos últimos 10 anos. Somente
essas políticas evitarão que as vantagens de um novo ciclo de crescimento
sejam apropriadas apenas por uma parcela ínfi ma da população. As for-
ças do mercado, em face das desigualdades existentes, infelizmente não
promovem a redução da desigualdade de renda. É fundamental uma ação
ativa do poder público. Qualquer diminuição a longo prazo da desigualdade
está intimamente relacionada às políticas públicas. Apesar de o
crescimento econômico contribuir para a melhoria desses índices, não
pode haver redução da desigualdade a longo prazo sem políticas públicas
sistemáticas de redistribuição de renda. Apenas com esses programas fi rmemente
implantados no orçamento nacional é que esses extraordiná-
rios níveis de desigualdade poderão ser fi nalmente reduzidos.
46 Soares et al., 2006.
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DESIGUALDADE E INDICADORES SOCIAIS NO BRASIL 115
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